01/12/2020

No decesso de Eduardo Lourenço


Mais do que louvaminhas, há que fazer por merecer. Fazer por merecer é dar o destaque ao que do seu labor intelectual e reflexivo se deve reter para deixar(mos) de ser o que (fomos) somos e que sendo intrínseco, idiossincrático, sempre contribuiu para contínuos malogros; mais do que ‘numa luta surda, mas tenaz e incoercível’ cerzir(mos) êxitos.

Não se trata de carpir(mos) e sim de ser(mos) consequente(s) ou seja, inteligente(s). Não se trata de cantar eventuais e transactas glórias, mas verberar passados e presentes falhanços colectivos. Dispensam-se loas a alguns dos momentos maiores da sua extensa obra «O labirinto da saudade» e «O esplendor do caos». E é o momento de reter o que a intelectualidade caseira, e a patuleia por maioria de razão, sempre fez por esconder, encobrir, disfarçar, mascarar até se para coisa diversa não fôr que sirva ao menos para, como escreveu, lograr(mos) “fugir dessa imagem reles de nós mesmos”.

Perpassam na minha mente o capítulo «Somos um povo de pobres com mentalidade de ricos» em concreto os sub-capítulos i) O trabalho para o preto, ii) O tradicional grito de «pouca sorte», iii) O aparato e a aparência e iv) Portugal, uma mina para Freud… e «Do intolerável» (de uma intervenção num colóquio organizado pela Fundação Marquês de Pombal em Outubro de 1996).

Reconhecido.

12/11/2020

Apodíctica falsa

            ·         A sociedade inquietou-se com o apoio parlamentar que o Chega! resolveu dar ao PSD/Açores para viabilizar a formação do governo regional.

Seria, caso essa percepção da sociedade fosse real, uma percepção errónea. Ademais a triste constatação é que se mantém a confusão entre «opinião pública» e opinião publicada. E a opinião publicada nem de perto nem de longe é reflexo da «opinião pública» nem, por maioria de razão, a «opinião pública» se revê na opinião publicada.

           ·         A esquerda, nomeadamente o PS, está receosa com a presuntiva afirmação do Chega! ― é uma percepção certa, mas não deve descartar-se o ardil.

 Seria uma percepção certa se não se desse o caso de se tratar de um ardil – involuntário, é verdade, e, oportunisticamente aproveitado pelo governo e PS. Quem beneficia? Enquanto se tolhem as línguas com papões e mauzões, não se atenta no desastre que tem sido o combate institucional à epidemia. O PS e os governos de António Costa carregam às costas umas largas centenas de cadáveres – as dos incêndios florestais e agora, muitas…

            ·         O Chega! é um perigo para a democracia.

É uma percepção errada ― o Chega! não passará de um epifenómeno (no estrito sentido do termo) e, a médio prazo, inconsequenteAcresce que ninguém foi politicamente mais criminoso para com a democracia em Portugal do que os partidos e os políticos tradicionais. O Chega! é filho de tudo o que tem de mau a democracia ― filho do tacticismo cobarde, da mentira, da incompetência da incúria e do laxismo instituído (antes larvar, hoje miasmático), do comportamento das instituições – umas vezes reles, outra vezes sórdida e outras tantas inexistente, etc…― daí ser indesejado. E não tendo como escondê-lo, tentam bani-lo, degredá-lo, amaldiçoam-no,…

            ·         Portugal carece de reformas

 É uma percepção certa, porém eminentemente retórica. Em Portugal reformas incisivas serão sempre algo na vizinhança da impossibilidade. Há ‘desejos’ melhor propósitos que tamanhas serão as doses de sofrimento que portam no bojo são deliciosos se lhes retirarmos os custos implícitos.
Serão feitas, sim  nunca como desígnio nem iniciativa nossa.

03/11/2020

Perpétuo Movimento

Hoje, na Ringstrasse, não há volteios valsados nem bailarinos a coreografar arabescos ‒ toca-se a severa «Rendition» de Gustav Mahler e tange-se a «Marcha Fúnebre» de Frédéric Chopin.

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Num dia de Junho de 1978, em Harvard, Aleksandr Solzhenitsyn disse, para quem o quis ouvir, «A world split apart»

“ (…) O declínio da coragem é a mais impressionante característica que um observador externo vê, hoje em dia, no ocidente. O mundo ocidental tem perdas de coragem cívica como um todo e, separadamente, em cada país, governo, partido político (…). Este declínio da coragem é particularmente perceptível nos ‘meios’ de decisão e nas elites intelectuais (…). Existem muitos indivíduos corajosos, mas não detêm uma influência determinante na vida pública. Políticos, funcionários e intelectuais exibem passividade e perplexidade nas acções, declarações e, ainda mais, nos raciocínios ‒ invariavelmente egoístas (…) ficam calados ou paralisados quando tem de lidar com governos poderosos e forças ameaçadoras, com agressores e terroristas internacionais (…) ”

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Estamos num tempo em que vale a ‘lição’ do barão de Rotschild

            ― “Quando vejo as ruas de Paris sujas de sangue, adquiro títulos franceses

A fase em que ‘o burguês entrega o dinheiro para salvar a pele’ porque, antes, ‘entregou o poder para salvar o dinheiro’ a fase em que se formam as «massas da arruaça» porque as matilhas acossadoras ainda carecem de uma mais forte percepção de perigo da parte das «massas da fuga».

“Os homens aprenderam com os lobos” - Elias Canetti

16/09/2020

Miopia prospectiva e muito lirismo tecnocrático

Uma visão que, no concernente à agricultura, pecuária, abastecimento de água às populações, etc... prescinde de considerar a «dessalinização», mas propõe o reforço da utilização das águas residuais, o reforço do represamento, a regularização dos caudais dos nossos rios, … é míope.

Israel é um Estado com uma população equivalente à nossa, em número – 9 milhões. Tenho a ideia (posso estar equivocado) de que Israel possui um ‘histórico’ prospectivo (em variadíssimos domínios) que, em relação a nós (mas não só!), é de outro mundo (digo eu, que sou um exagerado). Ora, Israel tanto quanto me é dado saber sustenta 55% da sua população através da dessalinização; a central que abastece Tel Aviv, Sorek, extrai 624.000 m3/dia do Mediterrâneo.

Curiosamente (força de expressão), dá todo o enlevo à indústria do hidrogénio (não disse que não deva ser equacionada) e à «mineração do mar profundo» ― Hellas! (isso mesmo, Shelley - The world’s great age begins anew, / the golden years return, / … / The world is weary of the past, / Oh, might it die or rest at last!) esta será merecer o reconhecimento de visionário – o Alvin Toffler ibérico). Com que tecnologia? A que preço? Com autorização de quem? Ora, ora…menos.

 Bilhete (fomos colegas na FEUL. E do Piri, do J. Gouveia, do J. Guerreiro, …)

Ouvi-te, na AR (Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação), afirmar qualquer coisa assim «Sr. deputado, sempre fui um democrata »
Sê-lo-ás, hoje, não duvido. Passaste a ser depois de teres ido dentro, em 1977. Até 1977, tinhas tanto de democrata como teve Lin Piao, Giap, …
Tiveste azar, perdeste. Se tivesses ganho, terias feito (forma de dizer) aos outros (Lopo do Nascimento, Agostinho Neto, S. Daskalos, Lúcio Lara, Rui Monteiro, …) exactamente o mesmo. Seria diferente, não?!
Estou convencido que já lograste a tarefa de reescrever a tua história. Compreendo e até acho uma desnecessidade já que contas, além do inegável mérito técnico-científico, com os melhores ofícios de uma apreciável ala jornalística (e citarei alguns dos nossos Kimbos ou que se fizeram nos nossos kimbos) – Nicolau Santos, Fernando Alves, José Alberto Machado (reformado), Ferreira Fernandes, David Borges, …e tantos outros que verás a assinar toda a sorte de florilégios, mas não estou para lembrar. Além do mais és poeta (o Agostinho Neto também era, enfim! E vê o que te fez ou deixou que fosse feito). Em suma 
Reescreveres a tua história, Não! Há pedacinhos que fazem imensa diferença. Assume-te, não será por isso que te caem os parentes na lama ou passam a olhar-te de soslaio. Soubeste garantir-te e, além do mais, todos nos enganamos e todos, um dia, versejámos.