03/10/2021

Largos dias têm cem anos

Em 19 de Agosto, a propósito da tomada de Kabul pelos talibans, titulei o post Do Afeganistão, preocupa-me (o futuro de) Taiwan que ‘fechei’
“(…) há 24 milhões de netos e bisnetos de Chiang Kai-shek, que não estiveram dispostos a aturar a “marcha” e o destino idealizado pelos maoístas, (…) fizeram da Formosa uma nação próspera reclamada por Pequim. E com estes os EUA nunca poderão limitar-se a encolher os ombros e deixá-los ao sabor do vento.”

 A última ‘provocação’ (sempre as tomei por testes), mas não a derradeira, foi na transacta sexta-feira – 01.10.2021.

Não são, por enquanto, estas sino-bravatas que preocupam, nem as outras feitas ao Japão e a Seul pelo Quim de PyongYang. Preocupa-me muitíssimo mais, em diversíssimos domínios, a difusa capitulação europeia ao capital chinês como foi a ‘opção’ de Portugal na privatização da EDP. É que, na prática e não somente na língua, para os chineses “largos dias têm cem anos”.
 
Se há um critério para dizer «está certo», há outro para dizer «está errado». É por isso que, quem é sábio, não se fia nesses critériosque também é um critério para se dizer «está certo»
Chuang Tse, Ensaio sobre a equiparação das coisas
 
Ora que se preparem os nossos bonzos para os fustigar na ONU, por exemplo, com a Moral, espezinhada, e a Ética, esborrifada. Certo será que, nessa eventualidade, pôr-se-ão a jeito para empacotar uma resposta lhana
Desta terra impregnada de ternura, só dois sentimentos se elevam para nós: a dor e o medo
…nem mais nem menos do que uma das múltiplas reflexões ― nunca aprendidas, desvalorizadas ou ignoradas ― de André Malraux, em 1926, n’Tentação do Ocidente numa das supostas missivas do sr. Ling-W.-Y para o sr. A.D.

28/09/2021

Não é incompetência; é falta de vergonha

Não irei enfronhar-me despropositamente pelos meandros da Estatística e do cálculo probabilístico ‒ de forma prosaica e coloquial porque, para a média dos meus concidadãos (não é defeito), a estatística pouco vai além da média aritmética – simples, e, um quartil será sinónimo de quadril e bootstrap (método de reamostragem) é um corpo celeste.
Mais um pleito eleitoral e, mais uma vez, as empresas de sondagens voltam a ficar com a credibilidade em causa. É bem feito! Não sejam videirinhos, cobardes e reajam.

São mercenários e, antes de qualquer outra coisa, prestam os melhores serviços a quem paga”, testemunham uns. Ora, quem lhes paga é a comunicação social ou os partidos, eles mesmos. E, assim sendo, errar uma vez por o tempo estar muito nublado é um risco que pode ser programado sem que daí advenha dano de reputação – não admira porque, em múltiplos âmbitos da sociedade, o método tem sido o de ‘se é difícil ou impossível drenar o pântano então mantenhamos incólume a natureza’ (atente que é por causa destas situações que muito se alude à contextualização – justificativa, apenas). Mas, se nenhum dos casos os satisfaz, então, tenho de recomendar aos especialistas que apurem/ajustem/aprimorem a «Estimação de Parâmetros».
Na medida em que não acredito na incompetência técnico-científica dos estatísticos, os erros clamorosos só podem radicar no interesse particular do órgão de comunicação social ou nos universos das amostras/painéis. Como? a comunicação social trabalha os dados conforme as suas preferências crendo na boa-fé e ‘ignorância’ dos leitores e/ou ‒ os ‘inquiridos’ mentem.

— Para o caso deixo os seguintes exemplos
•Arroios – 3 sondagens (Aximage, CESOP e GFK Metris)
A Aximage, em 28.8.2021, reportou algo que a redacção do Jornal de Notícias noticiou assim ― “Os presidentes das juntas de freguesia de Lisboa estão melhor cotados do que o presidente de Câmara. Se Medina consegue 42% de avaliações positivas, os líderes das juntas acumulam, em média, 49%. (…) apenas 21% dos lisboetas se mostram descontentes. (…) há 10% de fregueses que nem sequer se sente capaz de fazer uma avaliação. Onde os presidentes de Junta têm menor popularidade é nos grupos de freguesias do Parque das Nações/Olivais e da Penha de França /Arroios (todas socialistas). O saldo continua a ser positivo (14 e 15 pontos, respectivamente) (…) É também nestes dois grupos que há mais gente a fazer uma avaliação negativa dos autarcas (28% e 27%).
Isto é redacção de quem é isento e pretende esclarecer? Não é!

•o Públic(uzinh)


•Um semanário de Góis induzia
 

Já que a resposta/denúncia (há muito merecida) é, de todo, improvável que venha dos leitores então deveria ser dada/negociada nos contratos pelas ‘casas das sondagens’ – por exemplo, o texto do órgão de comunicação social terá de obter prévia concordância da parte do ‘prestador do serviço’.
 
— A segunda hipótese 
② é a de os ‘sondados’ mentirem. É tão só uma intuição ‒ e, acrescento, em circunstâncias sócio-políticas muito particulares (daquelas em que as 'maiorias silenciosas' inopinadamente encolhem).
São precisos muitos? Não! Num universo de 600 inquiridos se 30 mentirem, em tese, o resultado será adulterado em 5%. Tanto pode ser ‘catastrófico’ como quase não se notar. Depende, pelo menos, de margem de confiança.

10/09/2021

Do miserável estado em que nos encontramos

"Il y a toujours une philosophie pour le manque de courage"
escreveu, em 15 de janeiro de 1942, Albert Camus no Cahier IV (Carnets, 2º Vol.) 



28/08/2021

'Caminhos de floresta'

não são disputados por demasiados concorrentes, e recomenda a cautela que não sejam percorridos na companhia de arlequins, cata-ventos, charlatães ou embusteiros ― Sloterdijk é uma óptima companhia.

19/08/2021

Do Afeganistão, preocupa-me (o futuro de) Taiwan

A (sub-)espécie prevalente no ecossistema das faldas e vales da cordilheira do Hindu Kuch e mais a farândola endoutrinada nas madrassas, que desaguou em Kabul para instituir o Emirado islâmico do Afeganistão, interessa-me nada. Não lhes lamento o destino ― desde que contenham benefícios e prejuízos (independentemente da sua natureza) dentro das suas fronteiras.
Já que ao longo de milénios os povos do ‘império das estepes’ foram incapazes de realizar uma magna jirgah por forma a tentar constituir-se como nação, terão de se amanhar com a teocracia que lhes é imposta.
Não os lastimo! Ao invés de terem deixado que o ‘sangue que lhes corre nas veias’ bradasse mais, tivessem realizado os mínimos ― um deles seria “lutar por um certo futuro”. Mas não ‒ a maioria optou por uma cumplicidade dissimulada com umas dezenas de milhar de famélicos e miseráveis enquadrados por talibans.
Sucede(u) – é a dinâmica dos povos! Os povos escolhem livremente os heróis, determinam as preferências, e essas escolhas espelham o que são ‒ no decurso das centúrias podiam ter preservado a cultura Timurida, primeiro, não perder Samarcanda, segundo, cerrado fileiras em redor de Ahmad Durrani, terceiro,…mas sempre optaram pela tribo e/ou clã. Se, ao invés de terem deixado que o ‘sangue que lhes corre nas veias’ bradasse mais, tivessem realizado os mínimos a débacle de Kabul era evitável’.

Fatalmente, faz caminho a tese da «humilhação dos Estados Unidos» (e da OTAN) ‒ realce-se todavia que a maioria dos que agora verberam a humilhação (!) são os que bradavam contra as tentações imperialistas ― sim, imperialistas ― dos EUA, OTAN, enfim, da imposição de uma forma de vida e algumas outras depravações.
Quanto a isto, a administração de Biden tem absoluta razão ‒ os ‘editais’ da saída dos americanos do Afeganistão são da administração Obama, e foram revalidados pelas administrações Trump e Biden. E aqui bate o ponto ― as sequentes administrações ianque sabem, de ciência certa, da sua cada vez menor capacidade para o desempenho cabal de ‘polícias do mundo’.

Se o mundo restante não tomou boa nota ou não sabe é porque não quis nem lhe conveio ‒ há milhares de publicações sobre o assunto e matérias correlatas, de todas as formas e feitios, também com fins diversos, a começar pelo bem conhecido «Ascensão e queda das grandes potências» de Paul Kennedy/1988, «Colosso – Ascensão e queda do Império Americano» de Niall Ferguson/2004, os de Henry Kissinger, Emmanuel Todd,…
As sucessivas administrações ianques têm percebido a sua cada vez menor capacidade para o outrora reconhecido papel de ‘polícias do mundo’ e, após um século a ‘sustentar’ todo o tipo de organizações e instituições ― da ONU à miríade de macro-estruturas político-burocráticas que lhe estão apensas (UNICEF, UNESCO, FAO, BM, … por onde
escorrem anualmente milhares de milhões em proveito mais dos burocratas, académicos e ‘intelectuais’ ociosos * do que dos destinatários — em prol da humanidade, a enviar ‘carne para canhão’ para teatros de guerra fora de portas (caso da Iª grande guerra e IIª guerra mundial), a financiar máquinas de guerra de terceiros (à URSS na IIª guerra mundial) e mais o Japão, a Coreia, o Vietnam, o Irão, a Europa durante a Guerra-Fria,...
Pois bem, os americanos estão mais do que legitimados a questionarem-se do «para onde?» e «porquê?» têm de ir os seus filhos combater, e morrer. E o que menos diferença lhes deve fazer é que os acusem de isolacionistas!
Acresce que o presente ‘tecido social’ americano não é, hoje, o que foi há três ou quatro décadas é consultar os dados do último censos. Isso nas sociedades ocidentais determina algumas diferenças apreciáveis com repercussão directa na decisão política.

À Europa resta… os europeus terão definitivamente de assumir-se. As falsas dicotomias têm sido o reino dos políticos e têm feito um exitoso percurso apenas porque há muita gente a aceitar as premissas em causa. Ora, se as aceitem então não se queixem das consequências. A realidade infiltra-se pelas fendas. Assumam-se e deixem de andar de dedo indicador espetado!
Alardear superioridade civilizacional, arvorarem-se em protectores dos desvalidos, constituirem-se voluntariamente em abrigo para toda a sorte de deserdados, perseguidos e ostracizados ‒ ambientais, cataclísmicos, religiosos, políticos,…‒ montados no poder militar dissuasor dos americanos, acabou.

No seio disto há Taiwan e os 24 milhões de netos e bisnetos de Chiang Kai-shek, que não estiveram dispostos a aturar a “marcha” e o destino idealizado pelos maoístas, fizeram da Formosa ‒ meio-caminho entre a República Popular da China e o Japão ‒ uma nação próspera reclamada por Pequim. E com estes os EUA nunca poderão limitar-se a encolher os ombros e deixá-los ao sabor do vento.





 * sobre estes cortesãos há um excelente capítulo de Zia Haider Rahman/2014