"As nossas memórias não nos visitam por ordem cronológica, e a história que formamos ao unir essas memórias envolve escolhas que têm a função de criar uma unidade de conjunto e estabelecer um padrão."
Zafar *
pranteava,
ontem, a pivôt da CNN/Portugal, antes de dar a palavra a uma alma
contristada e ferida a quem foi recomendada a expectável ladainha.
Não fosse para isso não teria ido lá. O fundo, o mote, as crianças
que morrem à fome em Gaza.
Há nesta 'senda' um denominador comum ―
a ‘massa’ de que são feitos os elementos destas corjas 'de
especialistas da cooperação internacional que extravasam de amor
pela Humanidade’, mas sem qualquer interesse pelas pessoas em
concreto' e que se reinventam geração após geração, e se
espalham como cogumelos, e fazem parte de uma série de instituições
de índole diversa mas o mesmo propósito político nomeadamente nas
organizações constitutivas da ONU, nas múltiplas ONG's, na
comunicação social ― quantos escrevem pelo bifinho da refeição
seguinte! ― e nas igrejas ― no topo, a católica. Desta(s) hordas
de 'profissionais da caridade' ficcionou (?!), com a autoridade de
quem nasceu no Bangladesh rural, Zia Haider Rahman, em «À Luz do
que Sabemos».
Mais do que prestar atenção às fotos dos esquálidos
meninos do gueto de Varsóvia nas sucessivas versões, ao longo do
séc. XX e XXI ― o que me
surpreende é ainda não ter aparecido um Bono, Roger
Waters, Springsteen, Bob Geldof a realizar um (New) Live Aid para eu levar o meu
telemóvel-luzinha-acesa-no-escuro e cantar Give Peace a Chance
amolecendo estas e aquelas almas empedernidas ―,
há que realçar algo que, figurativamente, fica assaz explícito: às
salamandras de antanho sucederam os oxolotes do presente. Agora
esquadrinhe sobre o(s) porquê(s) do destronamento das salamandras
pelos oxolotes. As salamandras metamorfoseiam-se; o oxolote é uma
espécie de salamandra que, ao invés das salamandras, a dado passo
da sua evolução decidiu, por não encontrar vantagem, permanecer na
fase tipo girino.
“Pouco depois da intervenção americana do Afeganistão, os preços dos tapetes dispararam em flecha, muito devido ao facto de as hordas dos funcionários dos programas de auxílio e desenvolvimento (leia-se oxolotes) terem deitado mão a tudo o que havia de tapetes para mandarem para as suas casas em Londres, Nova Iorque, Paris, Bruxelas, … Os novos arautos do bem (os ‘girinos’) contribuíram para uma inflação maciça (…) médicos e engenheiros afegãos viram-se obrigados a deixar as suas profissões para servirem de choferes a dirigentes das Nações Unidas e organizações humanitárias.”
* * *
em Gaza, 2024
não é de fome, mas é (uma) dos milhares de afogados no Mediterrâneo (o efeito pretendido é o mesmo)
no Biafra (de 1967-1970)
no gueto de Varsóvia (de 1939-1942)
[os
velhinhos e crianças andrajosas, pele-e-osso que me arrancaram o
fígado e soltaram a bílis foram os da «versão Biafra». Depois
fui aprendendo muito, experienciando mais, reduzindo-me à minha
insignificância, e …, passo-lhes a vista por cima]
* * *
É
por isso que ouvi-los e/ou vê-los é uma tarefa difícil: corre-se o
risco de mudar o modo como se vê o mundo. Sempre me senti inclinado
a confrontar as pessoas - feitios! Sendo verdade que, cada um é que
sabe onde lhe aperta o sapato, não é menos verdade que saber ouvir
é conhecer os passos que a(s) pessoas deram na vida. No Afeganistão
como no Irão. Tal como no Bangladesh. Tal como na Síria. Tal como
na Índia e no Paquistão. Em França ou em Portugal. O parentesco e o patrocínio são duas das
mais prevalentes instâncias que, interligadas, fazem andar o mundo. Os ocidentais nunca se cansam de apontar o dedo à corrupção entre
eles; nunca se cansam de pôr em evidência as falhas morais deles
“E se lhes dermos ouvidos ficamos a pensar que não existe qualquer ponta de integridade em nós. Mas isso é ver o mundo de pernas para o ar. (...) Quando um político ou burocrata aceita dinheiro de comissões ou gratificações, está a fazê-lo, no fundo, em benefício de um grupo mais vasto. Com esse dinheiro paga a empregados, pistoleiros, apoiantes, e paga também o transporte e a hospitalidade política, e ainda reparte algum pelos seus familiares."
"Os sauditas gastam somas astronómicas em armas, apesar de não participarem numa guerra há setenta anos: as suas necessidades de defesa externa são asseguradas pelos Estados Unidos. Por que motivo gastam todo esse dinheiro? Muito dele vai parar aos bolsos dos princípes sauditas.”
Um
bandido não pode ser ilibado pelo facto de ter por trás dele um
bandido ainda maior.
* personagem da obra citada