20/01/2024

De que país(es) nos falam eles?

[Nota prévia: solicito e agradeço que o post seja lido com a indulgência e condescendência com que lêem outros de sensibilidade e conclusões diferentes ou opostas. Das gravuras anexas cada qual que tire as suas conclusões - eu desobrigo-me.]
Falam-nos de algo que, na realidade, não existe. E se por acaso aludem à necessidade do restabelecimento de uma pequena série de valores que, para as gerações nascidas no dealbar do séc. XXI, representam «zero»; para os próprios são o ramerrame. Teoricamente podiam abster-se de as fazerem, mas, de facto é-lhes impossível não as fazer. Além do mais há que reconhecer(-lhes) a óbvia desorientação e impotência perante o manancial de solicitações e exigências de toda a ordem e natureza mercê da comum deficiência de 'envergadura' na compreensão, pior, na antecipação das tremendas dinâmicas em relação às quais são em rigôr alheios. No seio destas obviedades há uma outra, vital, e que simplificando resumiria assim: constatada a falência da vontade e a ausência de empenho opta-se pela sacramental ou melhor, a oportunista inércia dos condenados. Depois o desespero leva-os a decisões (ou intenções) ridículas. Com que olhos se pode apreciar a decisão de Macron em pôr as crianças e pré-adolescentes, de ora em diante, nas escolas, a cantar «A Marselhesa»? Quem simultaneamente anda mundo afora rogando compreensão e perdão dos 'desmandos' franceses! Mas como fizeram eles este caminho? Quem acolheu Khomeini? Onde se refugiou o ‘imperador’ Bokassa? [Toca pois a receber os agradecimentos] Quem ao mesmo tempo propõe e dá respaldo a decisões na UE de uniformização, globalizantes! (desconsiderando que o contrário, os nacionalismos, já são aparentemente infactíveis)
A zona que se interpõe entre a mentira de tudo e a verdade iluminada de nós próprios é um baldio para os outros, e no qual se constrói a «psicologia das multidões»”
Vergílio Ferreira
2024 é um ano comemorativo. Desejam que seja jubilatório, mas falharão; farão o necessário para que seja liturgicamente impressivo, mas não será. As salmodias serão retrospectivamente dionisíacas e prospectivamente miríficas. As rábulas serão compósitas, e as plateias mandam. O dogma é «Os intrépidos, abnegados democratas resgataram-nos daquele portal do Inferno em que estávamos atolados»
A lírica, a prosápia sobre o decurso democrático de cinco décadas conterá tudo o que seja necessário por forma a esconder ou dissimular o contínuo cortejo de falhanços arrebatamentos (pelo povo), utopias (para o povo), descaramentos (com o povo), indecências (legitimadas pelo povo) e de poucas-vergonhas considerando os ciclícos escarcéus políticos, as consabidas e inúmeras vidas de pirata e não poucos de autêntico gangsterismo que vicejaram a coberto ou dentro dos partidos, o corropio à roda da mesa do orçamento, a contumácia e as múltiplas acções de pilhagem com cobertura política, etc
A pergunta não é retórica. Existem, em Portugal e na Europa, uma multiplicidade de dados que há uma década podiam ser considerados sinais inquietantes, mas presentemente são evidências alarmantes. Ainda assim depreciadas. Dessas cinjo-me aos demográficos pelo que representam na paleta de mudanças societais e que, pela sua natureza, contêm dinâmicas irrefreáveis e ainda menos reprimíveis. A Europa, sempre, por razões conjunturais e de curto prazo, manteve fechadas as várias janelas de oportunidade que se lhes depararam. Foram desvalorizados por meras conveniências políticas E sempre por tacticismo. Foram sub-valorizados, retorcidos e moldados de uma forma ideologicamente o mais coerente possível por uma parte avassaladora da academia e da presumida ‘intelectualidade’. E quem fosse dissonante, os menos volúveis, era/é de imediato submerso por um chorrilho de adjectivos pouco edificantes e substantivos «com forte marca» e, popularmente ― os psitacídeos não aprendem línguas, repetem vocábulos! ―, por impropérios.
"Há uma distância infinita entre a aparição da verdade, a imediata evidência de seja o que for, e até mesmo o seu reconhecimento; quando olhamos a evidência pela segunda vez já ela está alinhada, classificada, endurecida entre as coisas que nos cercam. Eis porque ignoramos ou esquecemos depressa a face do que há de estranho nos factos mais banais."
Vergílio Ferreira